O TEÓLOGO DA LIBERTAÇÃO
JUDAICA O crime descompensa O escritor gaúcho Moacyr Scliar diz que ele é uma espécie de teólogo da libertação judaica. Tem uma capacidade incrível de valorizar a dimensão humana da religião. Uma de suas majores virtudes, opina uma astróloga amiga, é fazer dessa tradição milenar uma religião compatível com a realidade dos dias de hoje. Nilton Bonder, 35 anos recém-completos, é o que se pode chamar de um rabino de sucesso, por mais estranho que o termo possa parecer quando empregado para qualificar um rabino. Engenheiro mecânico de formação, graduado pela Universidade de Columbia, de Nova York, Bonder se ordenou rabino no J ewish Theological Seminary, naquele mesmo estado, em 1986. Em apenas três anos, escreveu uma trilogia que virou best -seller: "A dieta do rabino - a cabala da comida", "A cabala do dinheiro" e "A cabala da inveja". São mais de 84 mil exemplares vendidos até agora. Na esteira desse sucesso - e da reflexão sobre a crise moral e ética vivida pelo país - Bo~der acaba de lançar mais um .fivro pela editora Imago: "O crime descompensa - um ensaio místico sobre a impunidade" (180 páginas). - Trato de episódios simples da realidade brasileira de uma maneira filosófica - explica o rabino. O livro tem capítulos com nomes sugestivos, como "Suportando a impunidade", "O Bem não tem que triunfar" e "Saiba responder ao herege". Segundo Nilton, a idéia de que "o crime descompensa" serve para contrariar o dito popular de que "o crime não compensa". Para ele, esse dito dissimula uma percepção muito ruim de que o crime só não vale a pena porque não compensa. - Na verdade, o que devemos ter em mente é que qualquer delito, por maior ou mais direto que seja seu resJlltado financeiro para um indivíduo, não compensa e acaba desequilibrando a sociedade como um todo - argumenta o rabino. Para explicar essa teoria, Bonder fala sobre a questão ecológica
e cita a violência do Rio. Em suas conversas particulares e nos ritos que celebra em sua sinagoga, a Congregação Judaica do Brasil, na Barra, da Tijuca, Bonder costuma debater trechos da Bíblia e discutir diversos aspectos filosóficos, psicológicos e até econômicos da tradição. Ele conta, por exemplo, a história de um homem que viajava num barco quando resolveu, de repente, fazer um buraco no casco, debaixo de sua poltrona. Os demais tripulantes protestaram e pediram para que ele parasse. Mas o sujeito respondeu: "Não se metam, o buraco é debaixo da minha cadeira." - A sociedade é um bem comum. Você não pode, mesmo que seja por direito, por lei, ter certas condutas - opina. Bonder é um rabino nada comum. Além de celebrar os ritos que a função exige; como casamentos, bar-mitzvas e enterros, ele se veste e se comporta como um jovem carioca. Gosta de correr na praia, de nadar e jogar tênis. Ouve rock e usa um computador para escrever seus livros. Casado com a arquiteta Esther Kramer, pai do recém-nascido Daniel Bonder é muito requisitado a aconselhar jovens, idosos ou casais em crise. - Ele é um terapeuta da alma - opina a astróloga Esther Sterenfeld. Bonder conta que também é chamado para atuar em situações paranormais: - Há situações em que as pessoas sentem vibrações complicadas, mal-assobradas, e buscam o rabino para ajudá-Ias a se livrar dessas energias ruins. Bonder recorre então aos procedimentos dentro da tradição judaica para exorcizar essas energias. Ele cita casos de crianças "poltergeist" visitando sua sinagoga. - Certa vez recebi uma criança problemática, que realizava fenômenos muito parecidos aos descritos na literatura paranormal. Ao entrar na minha sala, ela me transmitiu uma energia muito forte, pesada, e quebrou um quadro com um diploma atrás de mim. São coisas que a gente não sabe explicar - diz. Gaúcho, morador no Rio desde a infância, Nilton Bonder sempre teve curiosidade pela astronomia, pela física teórica e assuntos místicos. Ele rejeita o rótulo de "rabino moderninho". - Apenas tiro o mofo e a poeira para que as pessoas com alergia, possam chegar nos livros e aprender que a tradição traz coisas lindíssimas - afirma. Bonder diz que pertence a linha conservadora da religião judaica, nem ortodoxa, nem reformista. Mas os ortodoxos não pensam bem assim e não podem nem ouvir falar em seu nome. - Não o conheço pessoalmente, nem tenho nada contra a pessoa dele. Sei apenas que não temos uma linguagem comum e que temos divergências ideológicas. Ele é super-super liberal opina o rabino ortodoxo Eliezer Stauberg, da Sinagoga de Copacabana. Bonder fala de Bonder: - A diferença entre eu e outros rabinos é que estou sempre preocupado em encontrar uma ponte com a realidade das pessoas e não estar fechado num quarto cheio de livros tentando sozinho elocubrar sobre a religião.
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